O Instituto Mundial do Meio Ambiente das Nações Unidas - Programa Conservation Monitoring Centre - estima que cerca de 23% da superfície terrestre engloba ecossistemas de montanha.
Um ecossistema de montanha é definido em primeiro lugar, pela sua inclinação e elevação. Além disso, a proximidade do oceano ajuda a caracterizar o clima, portanto, algumas das montanhas são húmidas, outras mais secas. As condições climáticas de um ecossistema de montanha são fortemente influenciadas pela direção dos ventos dominantes e as variações de precipitação. Os ecossistemas de montanha são formados ao longo de milhões de anos pelas condições geológicas. As atividades vulcânica e sísmica também desempenham um papel importante nos ecossistemas das montanhas dando determinadas características físicas.
Os ecossistemas de montanha estão entre as regiões de maior biodiversidade no mundo. Trinta e dois por cento de todas as áreas protegidas estão em regiões montanhosas.
Ecossistemas de Montanha Ilha Terceira
Serra de Santa Bárbara, ilha Terceira
A Serra de Santa Bárbara localiza-se no concelho de Angra do Heroísmo, no extremo oeste da ilha Terceira, nos Açores. Constitui-se nos restos de um vulcão inativo – o maior da ilha - que se eleva a 1021 metros acima do nível do mar. Constitui-se ainda no maior ponto de condensação de nuvens da ilha, formando uma bacia hidrográfica própria que, além de permitir a alimentação do lençol freático, abastece de água a parte oeste da ilha.
Os habitats prioritários nesta zona são charcos temporários mediterrânicos, charnecas macaronésicas endémicas, turfeiras ativas e turfeiras arborizadas, laurissilvas dos Açores e florestas macaronésicas de Cedro-do-mato (Juniperus brevifolia). Das espécies da flora endémica dos Açores que se podem observar neste sítio, salientam-se a Angélica (Angelica lignescens), o Trovisco-macho (Euphorbia stygiana) e a Alfacinha (Lactuca watsoniana).
Muitas espécies faunísticas ocorrem na caldeira da serra de Santa Bárbara. As observadas em maior número são aves, algumas destas sedentárias: Galinhola (Scolopax rusticola), Narceja (Gallinago gallinago), Melro-preto (Turdus merula azorensis), Estrelinha (Regulus regulus inermis) e Milhafre (Buteo buteo rothschildi).
Foto 1: Urze ou vassoura (Erica azorica) nos estratos mais baixos do perfil vertical.
Foto 2: Uva-da-serra" (Vaccinium cilyndraceum) planta vascular comum na zona abaixo dos 1500m de altitude.
Foto 3: Hornito, estrutura na rocha que abriga espécies menos frequentes. Pico do Pico.
Foto 4: Montanha do Pico, onde é possível observar-se o perfil altitudinal, onde as camadas de rocha nua sucedem às camadas de vegetação mais ou menos densas. Foto: Ulisses Rosa.
Foto 5: Presença de líquenes folhosos.
Foto 6: Presença de líquenes e briófitos no solo.
Alfacinha (Lactuca watsoniana). Foto: Pedro Avelar.
Reserva Natural do Pico da Vara
ZPE Pico da Vara /Ribeira do Guilherme
O Pico da Vara é o ponto mais alto da ilha de São Miguel (média 889m), e constitui a parte oriental e mais antiga da ilha, geologicamente falando, com cerca de 4,000,000 anos. A Reserva Natural do Pico da Vara inclui no seu território a Zona de Proteção Especial do Pico da Vara /Ribeira do Guilherme, no âmbito da Rede Natura 2000, encontra-se ainda classificada como Área Importante para Aves - IBA, pela Bird Life International e faz parte integrante do projeto Biótopo CORINE.
Esta reserva natural corresponde a uma área de 1982 hectares, localizada em altitudes entre os 260m e os 1105m. Em termos de geomorfologia, tem um relevo bastante acidentado com zonas montanhosas contrastando com profundas ravinas bem como um sistema hidrológico complexo, com inúmeras ribeiras das quais se destaca a Ribeira do Guilherme (regime permanente). A sua geologia integra-se na do Complexo Vulcânico Basáltico do Nordeste e é dominada por basaltos e materiais de projeção bastante erodidos. De referir a existência de uma elevada riqueza botânica e paisagística que, em termos de ameaças, está sujeita a fenómenos erosivos, introdução de exóticas, pastoreio e também a pressão cinegética (caça).
Relativamente à sua caracterização biológica, a sua vegetação inclui no seu cume um prado de Deschampsia foliosa (“feno”) e nas suas vertentes uma densa floresta de Laurissilva, que apresenta um índice de endemismos muito elevado, onde se destacam: cedro-do-mato (Juniperus brevifolia); louro (Laurus azorica); ginja (Prunus azorica), a urze (Erica azorica) a uva-da-serra (Vaccinium cylindraceum), o folhado (Viburnum treleasei), o azevinho (Ilex perado ssp. azorica); feto-do-cabelinho (Culcita macrocarpa) e o feto-de-botão (Woodwardia radicans).
Das espécies de avifauna existentes, a mais especial é o priôlo (Pyrrhula murina), um passeriforme terrestre raro, endémico dos Açores, em risco de extinção e com estatuto de conservação prioritário pela Diretiva Aves. O último refúgio desta espécie está confinado à floresta de Laurissilva aqui existente. Pode ainda observar-se o tentilhão (Fringilla coelebs moreletti), o milhafre (Buteo buteo rothschildi) e o pombo-torcaz-dos-Açores (Columba palumbus azoricus), entre muitas outras.
Foto Priolo (Pyrrhula murina) espécie endémica dos Açores.
"Feno" (Deschampsia foliosa). Planta endémica dos Açores.
Ginja /"ginjeira do mato" (Prunus azorica), endémica dos Açores.
Funções
As montanhas são regiões mundialmente importantes,
como reservas de biodiversidade, como lugares de recreio e turismo e com
um património cultural vasto. Também fornecem recursos fundamentais,
como minérios, produtos florestais e produtos agrícolas.
Enquanto
importante ecossistema que representa a ecologia complexa e
inter-relacionada de nosso planeta, os ambientes montanhosos são
essenciais para a biosfera (Foto 7).
Os ecossistemas de montanha
desempenham um papel fundamental na manutenção do ciclo hidrológico
devido à frequente precipitação nas regiões montanhosas (Foto 8) e ao
papel das florestas na diminuição da velocidade de escorrência
superficial, aumentando a capacidade de retenção hídrica dos solos e
contribuindo para a recarga dos aquíferos subterrâneos. Nestes meios húmidos existem turfeiras importantes onde se desenvolve uma atividade biológica a eles adaptada, que também contribui para a absorção da água. São por isso
ecossistemas determinantes na qualidade, quantidade e regularidade com
que a água é aprovisionada.
Os
ecossistemas de montanha caracterizam-se por uma grande riqueza de
espécies e partilham aspectos comuns do ponto de vista da
biodiversidade. Um primeiro ponto é o facto de os ecossistemas de
montanha serem elementos importantes das ilhas oceânicas; um segundo
aspecto é o facto das montanhas constituírem efetivamente ambientes
insulares para espécies não tolerantes às condições de baixa altitude.
Assim, as montanhas, tal como as ilhas, suportam biocenoses distintas,
marcadas por uma grande riqueza de espécies ou sub-espécies endémicas.
No
caso das ilhas, acresce o facto de existir um isolamento espacial real
que afecta todas as comunidades no interior da ilha e que contribui para
valores muito elevados de endemismo (cerca de 420 taxa endémicos no
arquipélago dos Açores). A grande diversidade de espécies em
ecossistemas de montanha é potenciada pelo gradiente de altitude, que
promove o desenvolvimento de comunidades distintas adaptadas às
condições abióticas características dos vários degraus altitudinais.
Foto 7: Montanha do Pico, ilha do Pico.
Foto 8: Formação de nuvens por condensação, responsáveis pelas chuvas orográficas. Serra de Santa Bárbara, ilha Terceira.
Classificação
Montanhas dobradas ou orogénicas São o tipo mais comum de montanhas. Formam-se devido à colisão de duas placas tectónicas, causando o dobrar da crosta da Terra. Exemplos: Himalaias na Ásia, Montanhas rochosas na América e os Alpes na Europa.
Montanhas em falha São formadas na vertical, ao longo de grandes planos de falha, originando grandes massas de blocos escarpados. Os vales de falha são também formados desta maneira. Os blocos deslizam ao longo de falhas na crosta. Existem dois tipos de montanhas de blocos, as alevantadas e inclinadas. Exemplo: Serra Nevada serra do oeste dos Estados Unidos, Monte Kilimanjaro, 5.895 metros (19.341 pés), Tanzânia
Montanhas vulcânicas São formadas devido a erupções vulcânicas. Exemplos: Monte Fuji no Japão, Monte Pinatubo, nas Filipinas, Pico do Pico e restantes montanhas e serras nos Açores.
Ecossistemas Ilha do Pico
Reserva Natural da Montanha do Pico Esta montanha, o ponto mais alto de Portugal com 2351m de altitude, dá o nome à ilha do Pico. A Montanha do Pico foi primeiramente classificada em março de 1972 com o estatuto de Reserva Natural, medida que salvaguarda uma área de cerca de 1500 hectares, incluindo a parte superior do vulcão, acima da cota dos 1200m.
O vulcão do Pico é um estratovulcão geologicamente muito recente (cerca de 750 000 anos), tendo-se registado a sua última atividade no seu flanco sueste (São João) no século XVIII. Este é constituído por correntes de lava, com predominância de basaltos e materiais de projeção. Apresenta vertentes com forte declive. Estas terminam no rebordo irregular da caldeira vulcânica, local onde emergiu o último cone vulcânico - o Pico Pequeno ou Piquinho. Nas vertentes mais altas da montanha existem areias e formações vulcânicas muito interessantes: algares; hornitos; vales cavados; cavernas e cones adventícios (laterais à montanha).
O sopé da montanha termina no planalto central da ilha, excepto na zona da Ponta da Faca, onde a montanha encontra o mar. A paisagem que circunda a montanha é diversa e constata-se a estratificação vertical ao nível de espécies. Mais abaixo, na zona de pastagem, existem várias lagoas (Lagoa do Capitão ou a Lagoa do Caiado), situadas no planalto central, onde ocorrem lagoas de várias dimensões.
Considerando a altitude da montanha, em termos de condições climatológicas, de referir a elevada frequência da queda de neve durante o inverno, a abundância de chuvas praticamente durante todo o ano e a presença frequente, principalmente em altitude, de nevoeiros. O fator altitude somado a estas características climáticas específicas, em associação com o solo vulcânico da montanha, estão na origem de uma cobertura vegetal bastante específica. Como as condições climáticas tendem a ser mais adversas, surge uma vegetação rasteira adaptada a essas condições e estratificada em altitude.
Em termos de estratificação de coberto vegetal, surge aos 1200-1400m (em locais mais abrigados), um tipo de bosque arbustivo onde predominam espécies endémicas dos Açores, Macaronésia e nativas, como o Ilex perado ssp. azorica (azevinho, endémico da Macaronésia), Juniperus brevifolia (cedro do mato, endémico dos Açores), Vaccinium cylindraceum (uva-da-serra, endémica dos Açores), ou a Erica azorica (urze, endémica dos Açores), entre outras espécies típicas das florestas da Laurissilva, características da Macaronésia (ver ecossistema).
Acima dos 1800m de altitude, a ocupação vegetal começa a diminuir drasticamente, surgindo apenas em locais menos expostos ao clima. Acima dos 1800m, salvo as seguintes excepções, o coberto vegetal resume-se a líquenes e musgos, entramos numa zona agreste onde predominam fortes correntes de lava, grandes depósitos de cascalhos, areais e outras formações geológicas e paisagem muito interessantes ao nível cénico. Contudo é de destacar nesta zona a existência de plantas muito adaptadas a este inóspito habitat e de distribuição restrita como a queiró (Daboecia azorica), a rapa (Calluna vulgaris), o tomilho bravo (Thymus caespititius), e por exemplo espécies como a Polygala sp. e, apenas acima dos 2200m, a rara Silene vulgaris cratericola - endémica dos Açores e restrita apenas a esta montanha (ver foto).
Devido à altitude e às rudes condições de habitat, a avifauna existente não se apresenta muito variada (principalmente no inverno). São poucas as espécies de aves que se reproduzem na época fria, principalmente devido a escassez de comida, mas as que o fazem, procuram a alimentação específica desta altura do ano. No verão ocorrem aves como o Serinus canaria (canário), Fringila coelebs (tentilhão), Sturnus vulgaris (estorninho) e o Buteo buteo (milhafre). Em termos de mamíferos, o endémico Nyctalus azoreum (morcego-dos-açores) também é muito visto nesta área.
Curiosidades A escalada desta Montanha constitui o Trilho Pedestre da Montanha do Pico que, devido à sua perigosidade, deu origem à criação da Carta de Princípios de Escalada à Montanha do Pico.
Na parte mais baixa das suas encostas encontra-se a Paisagem da Cultura da Vinha da Ilha do Pico, classificada pela UNESCO como património mundial.
Montanha do Pico (ponto mais alto de Portugal). Foto Pedro Avelar.
São formadas quando o magma quente sobe a partir do manto e eleva a camada sedimentar da crosta sobrejacente. São chamadas de montanhas em cúpula devido à sua forma. Exemplo Navajo Mountain, no Utah, EUA.
Exemplo dos "Mistérios Negros"
Os "Mistérios Negros", localizados no maciço da Serra de Santa Bárbara, na ilha Terceira, incluem três domas traquíticas de rocha negra irregular, com origem na última erupção histórica decorrida em 1761. As domas traquíticas formam-se quando a lava é muito viscosa e tem dificuldade em fluir, acumulando-se diretamente sobre a abertura emissora. Estas domas revelam internamente camadas concêntricas e o exterior composto por material muito fragmentado. Estas estruturas evidenciam uma estrutura rochosa interna segundo camadas concêntricas e níveis mais extremos compostos por material muito fragmentado.
Montanhas em planalto Não são verdadeiras montanhas pois formam-se devido a fenómenos erosivos. Geralmente ocorrem perto de cordilheiras montanhosas. Um exemplo são as Catskill Mountains em Nova York.
Domas traquíticas nos Mistérios Negros, Serra de Santa Bárbara. Foto: Pedro Avelar.
Domas traquíticas nos Mistérios Negros, Serra de Santa Bárbara. Foto: Pedro Avelar.
Estado de Conservação e Ameaças
As montanhas são regiões mundialmente importantes como fonte de água potável do planeta, como reservas de biodiversidade, como lugares de recreio e turismo e com um património cultural vasto. Contudo encontram-se muito ameaçadas, principalmente por causa de ocupação desordenada (Fotos 9 e 10), pressão turística, incêndios e poluição com consequências graves a nível da diminuição da biodiversidade, contaminação de aquíferos e redução importante de habitats muito próprios das montanhas.
As montanhas são uma das áreas mais frágeis do planeta e encontram-se em permanente risco de degradação, pois são extremamente vulneráveis à erosão acelerada do solo, deslizamento de terras e à rápida perda da diversidade genética e de habitat.
Nos Açores, as zonas de montanha são muito frequentadas por visitantes o que, através do pisoteio da vegetação natural, abrindo clareiras, e do transporte acidental dos diásporos de plantas introduzidas existentes a menor altitude, poderá facilitar a instalação dessas espécies. Assim, é essencial a monitorização dos trilhos de acesso aos ecossistemas de montanha, e a implementação de medidas de contenção das invasões biológicas no respectivo ecossistema de montanha.
Foto 9: Presença de gado nos estratos inferiores da montanha do Pico. Foto: Ulissses Rosa.
Foto 10: Presença de visitantes e turismo ocasional na montanha do Pico. Foto: Ulisses Rosa.
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